A relação das aldeias Guarani com os juruá (não indígena), não é apenas uma questão de escolha. Ao estabelecer o regime de tutela, existente desde o século XIX, mas oficializada apenas no século XX, o governo também explorava as terras indígenas, em associação com outros grupos e poderes privados agropastoris, e madeireiras. Esta visão de que os povos indígenas precisavam se integrar à cultura nacional não indígena, partia da ideia de que as sociedades europeias seriam superiores, e que as comunidades nativas precisariam aderir a esta cultura para se emancipar da tutela. Este ponto de vista encontrava apoio na filosofia positivista, que predominava nas universidades e na política, no final do século XIX e início do século XX. Entretanto, além das políticas não indígenas de extermínio cultural a longo prazo, alguns grupos não indígenas defendiam as políticas de extermínio físico, à curto prazo… esta política muitas vezes se concretizou, através da contratação de capangas e bugreiros (pessoas que conheciam bem a mata, e os costumes de certas etnias indígenas), ou do uso militar e policial, para o extermínio indígena.

No Brasil República, a temática indígena é tema das respectivas Constituições, exceto a primeira, de 1891, que sequer menciona a presença indígena no território nacional. Embora a Constituição não mencione o tema, o debate foi acalorado entre os que defendiam o extermínio dos indígenas, a exemplo do Diretor do Museu Paulista, Von Ihering, e os que defendiam a integração do indígena à comunhão nacional, proposta de intelectuais adeptos da filosofia positivista. Resultado desse contexto foi a criação do SPI como órgão público federal para assistência e proteção às populações indígenas. Como forma de proteção, foi instituída a tutela governamental a todos os indígenas. Embora o regime tutelar fosse aplicado no Brasil desde o século XIX aos indígenas libertos das guerras justas, foi na República que a tutela foi empregada a todos os indígenas, da qual poderiam se emancipar progressivamente na medida em que adotassem a língua portuguesa e abandonassem seus costumes, e, principalmente, aderissem à propriedade privada da terra. Portanto, em vez de ser amparo e proteção, a tutela foi empregada para submeter os indígenas às regras externas, mantê-los confinados em pequenas reservas e impedi-los de se manifestarem. (BRIGHENTI, 2015, p. 149).

Esta realidade de violência continua ocorrendo em várias regiões do Brasil, com várias etnias indígenas que são afetadas pelos interesses de governos, fazendeiros, ou empresários locais, além do crescente interesse das empresas multinacionais que vem tomando conta dos territórios brasileiro para o plantio de produtos transgênicos e agrotóxicos. O Estado do Mato Grosso do Sul possui um dos maiores índices de assassinato de pessoas indígenas do Brasil. Os povos Guarani kaiowá sofrem inúmeras pressões e agressões, fruto da violência de fazendeiros e empresários da região interessados nas Terras Indígenas kaiowá, assim como do descaso do Estado brasileiro, e dos preconceitos da sociedade, para com os povos indígenas… Em junho de 2016, na cidade de Caarapó (MS), terras em processo de demarcação situadas ao redor da Terra Indígena Dourados, Amambai Peguá, foram tomadas por fazendeiros, levando a um conflito que resultou na morte de uma pessoa Guarani kaiowá, o agente de saúde indígena Clodiodi Aquileu Rodrigues de Souza, de 26 anos, e outros seis foram hospitalizados, cinco deles em estado grave, entre os quais uma criança, e mais cinco Guarani, entre eles, uma criança. A tragédia ficou conhecida como Massacre de Caarapó. Assista a um dos vídeos publicados pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), sobre este momento:

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Os fazendeiros locais buscaram expor, através do Sindicato Ruralista, sua versão sobre o ocorrido. O relato do presidente do sindicato, entretanto, não condiz com os registros médicos, os vídeos gravados pelo Centro Indigenista Missionário (CIMI), ou com os autos policiais. O evento também foi noticiado em rede nacional, através da tevê aberta:

http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2016/06/indio-guarani-kaiowa-morre-em-confronto-com-produtores-rurais.html

O dossiê levantado pelo CIMI, sobre o Massacre de Caarapó, aponta que as causas da violência ocorridas em Caarapó (MS) estão relacionadas com algumas famílias Guarani e kaiowá da reserva Tey’ikue, em 12 de junho de 2016, ocuparem uma região ancestral conhecida pelos indígenas como Toro Paso – uma das áreas que compõem o território tradicional e originário Dourados-Amambaipeguá. Esta área já teria sido reconhecida e delimitada pelo estado brasileiro. Entretanto, ali incidia a fazenda Yvu, de 490 hectares, onde se produzia soja e gado. Você pode ver o dossiê completo, clicando no seguinte link:

http://cimi.org.br/massacredecaarapo/faq/.

Ouça, agora, uma das lideranças kaiowa falando sobre o massacre, e realizando uma crítica à cobertura midiática dos acontecimentos.

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Na fala das lideranças kaiowá, fica evidente a importância da terra ancestral, relacionada a história e à cultura dos povos Guarani. Também fica evidente que a tomada de terras está relacionada à paralisação do processo administrativo de demarcação da Terra Indígena, que já havia sido delimitada, e mesmo assim estava sendo ocupada por fazendeiros. Você acha que as mídias não indígenas (a notícia transmitida no Jornal Nacional, e no jornal Notícias Agrícolas) deram importância a esta questão? Como elas trataram o tema? Caso você queira acompanhar a situação dos Guarani kaiowá no Mato Grosso do Sul, pesquise na internet, ou mesmo no youtube… Infelizmente, haverá muitas notícias, enquanto a situação dos Guarani kaiowá continua sendo de violência e espera pela conclusão da demarcação das Terras Indígenas…

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