A anciã Pauliciana é muito conhecida em várias aldeias Guarani Mbya. Ela aprendeu a arte da cestaria com os seus ancestrais, e ao ensinar as artes artesanais, ensina também os fundamentos da pessoa Guarani Mbya. Os conhecimentos sobre a elaboração dos ajaka (cestarias Guarani Mbya) é passada de geração para geração, e muitas das vezes, dos pais para os filhos. Os pais inserem as crianças no mbya reko (modo de ser Mbya Guarani) e fortalecem seus nhe’e (espírito nome que protege a pessoa). Existem diferentes estilos, padrões e formas, que caracterizam e são ensinados de acordo com a família, e principalmente o amba (morada celestial) do nhe’e. Os desenhos dos trançados das cestarias variam, e, portanto, seus significados também variam. Os ensinamentos não são como nas escolas dos juruá (não indígenas) … não existe uma explicação passo a passo. As pessoas, desde crianças, são imersas na cultura e vão ouvindo as histórias dos pais e dos mais velhos, que através da oralidade, vão contando como fazem os cestos. Os mbya mais jovens vão aprendendo, e com o tempo vão contando as histórias de como se fazem os artesanatos para os mais jovens, tomando o lugar dos que lhes ensinaram: assim, o que é ensinado não desaparece…

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Entre as histórias que Pauliciana conta para ensinar os Guarani Mbya a elaborar os artesanatos, está a história de Ipara Tanambi Pepo. Em Guarani, Tanambi Pepo significa asa de mariposa. Para Nhamandu, na cultura Guarani, o papel do Ipara Tanambi Pepo pode ser o de lembrar que a mariposa é “[…] um bicho que fica em casa” e que pode ser nocivo às pessoas, pois as escamas da mariposa, ao serem tocadas, saem em forma de pó, como de qualquer lepidóptero, e podem provocar irritação nos olhos e até conjuntivite em função da sensibilidade dos indivíduos, e também podem causam irritação na pele (LORENZONI, 2010, p. 157). Mas também pode significar um agradecimento à liberdade dos Guarani, como a borboleta, que voa livremente pelas casas…

Ipara Tanambi Pepo – O ajaka com o desenho da asa da popo – mariposa) significa o respeito e agradecimento a liberdade, pois a borboleta sempre está a voar livremente e o Guarani fica feliz quando ela voa em volta de sua casa (SILVA, 2015, p. 25).

Dona Pauliciana participava com frequência das atividades escolares, na Tekoá Koenju. No processo educacional Guarani Mbya, a escola é um dos espaços em que as pessoas aprendem, mas existem espaços por onde os Guarani recebem a primeira educação, dentro do Nhandereko (sistema cultural Guarani Mbya), como é na Opy (Casa de Reza). Lá, os mais velhos ensinam os conhecimentos Guarani, como por exemplo, a esculpir os bichinhos em madeira. Os mais velhos são como “bibliotecas vivas”, e através da oralidade, os jovens vão aprendendo a realizar diversas atividades, e os significados destas atividades. Por isso, as escolas Guarani Mbya buscam os anciões durante o processo pedagógico. As esculturas de animais ensinam os Guarani Mbya quais são os animais que eles encontram nas matas, e como viviam seus antepassados. A escola Sepé Tiaraju, localizada na Aldeia Gengibre, é um dos exemplos das escolas Guarani que utilizam a produção artesanal para o aprendizado.

Fonte: Escola Sepé Tiaraju. (SILVA, 2015, p. 18).

As esculturas transmitem os valores do Mbya eko (modo de ser Guarani Mbya), e mostram as relações da comunidade com a natureza, ensinando os mais jovens a cultivar esta relação, e entender a presença dos espíritos e dos deuses, para que possa fazer coisas boas, e não deixar seu angue (sua áurea) afetar o meio em que vivem…

Artesanato em madeira pirogravada, mostra a relação do Guarani com a natureza (o natural) e o sobrenatural. Os animais esculpidos pertencem aos bichinhos que moram nas terras férteis, nos rios e nas matas e retratam os animais que vivem e dependem da floresta. Eles sempre serviram de alimento para o corpo e para o espírito Guarani. Os bichinhos de madeira simbolizam o modo de viver e a relação da comunidade com os seres da natureza. Por exemplo: “a corujinha”, significa o fortalecimento, a direção e o respeito. (SILVA, 2015, p.18).

Os artefatos musicais elaborados pelos Mbya Guarani também constituem os artesanatos que transmitem saberes. A utilização do Pau de Chuva, é frequente nos corais, e nos cantos realizados na Opy (Casa de Reza). Ele é um instrumento musical idiofônico (o próprio corpo do instrumento produz o som) de percussão e ritmo.

Fonte: www.iande.art.br. (SILVA,2015, p. 15).

Através do Pau de Chuva, os Guarani Mbya aprendem a conduzir o ritmo musical dos cantos, que estão ligados ao próprio ritmo de viver Guarani Mbya, e à meditação, pois produzem sons vinculados à natureza, e geram tranquilidade. Além de transmitir saberes relacionados à música, o Pau de Chuva tem finalidades terapêuticas, e seus desenhos carregam significados vinculados ao Nhandereko (sistema cultural Guarani Mbya).

O pau de chuva tem um poder terapêutico: “Quando uma pessoa está aborrecida com alguma coisa, se precisa relaxar, utiliza o pau de chuva que se consegue tranquilizar” (Sérgio, educador Mbyá).

Os desenhos feitos no pau de chuva estão ligados à natureza, aos animais e a caça. Os que parecem estrelas é a marca das caças realizadas e significa uma forma de contagem. Os principais desenhos encontrados no pau de chuva são: da cobra coral (Mboi Pytã), da cobra jararaca (mboi para) e o desenho de asterisco é o que representa as caças conseguidas, é uma homenagem aos homens da aldeia que conseguem trazer da mata o animal abatido para seu consumo. (SILVA, 2015, p. 15).

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